Reconhecimento da Existência dos Espíritos e de suas Manifestações
PUBLICADO NA REVISTA ESPÍRITA 1858JANEIRO D E 1858 Por Allan Kardec
Se as primeiras manifestações espíritas fizeram
numerosos adeptos, não somente encontraram muitos incrédulos,
mas adversários ferrenhos e, muitas vezes, até interessados em seu
descrédito.
Hoje, os fatos falam tão alto que é forçoso reconhecer a
evidência e, se ainda existem incrédulos sistemáticos, podemos
predizer-lhes com segurança que não se passarão muitos anos para
acontecer com os Espíritos o que se deu com a maior parte das
descobertas, que foram pertinazmente combatidas ou encaradas
como utopias por aqueles cujo saber deveria tê-los tornado menos
cépticos no que diz respeito ao progresso.
Já vimos muitas pessoas,
entre as que não se aprofundaram nesses estranhos fenômenos,
concordar que nosso século é tão fecundo em fatos extraordinários,
a Natureza tem tantos recursos desconhecidos, que seria mais que
leviandade negar-se a possibilidade daquilo que se não compreende.
Esses tais dão prova de sabedoria. Eis aqui uma autoridade que
não poderia ser suspeita de prestar-se levianamente a uma
mistificação, a Civiltà Cattolica, um dos principais jornais eclesiásticos
de Roma. Reproduziremos, mais adiante, um artigo que esse jornal
publicou no mês de março passado, no qual se verá que seria difícil
provar a existência e a manifestação dos Espíritos por argumentos
mais peremptórios. É verdade que divergimos dele sobre a natureza
dos Espíritos; não admitem senão os maus, enquanto admitimos
bons e maus; é um ponto que abordaremos mais tarde, com todos
os desenvolvimentos necessários.
O reconhecimento das
manifestações espíritas por uma autoridade tão grave e tão
respeitável é um ponto capital. Resta, pois, julgá-las: é o que faremos
no próximo número. Reproduzindo o artigo, o Univers o faz preceder
das seguintes e sábias reflexões:
“Por ocasião da publicação de uma obra, em Ferrara,
sobre a prática do magnetismo animal, referimos aos nossos leitores
os sábios artigos que acabavam de aparecer na Civiltà Cattolica, de Roma, sobre a Necromancia moderna, reservando-nos trazer-lhes mais
amplas informações. Publicamos hoje o último desses artigos que,
em algumas páginas, contém as conclusões da revista romana.
Além
do interesse que naturalmente se liga a essas matérias, e a confiança
que deve inspirar um trabalho publicado pela Civiltà, a oportunidade
particular da questão nos dispensa, neste momento, de chamar a
atenção para uma matéria que muitas pessoas, na teoria como na
prática, trataram de maneira tão pouco séria, a despeito da regra de
vulgar prudência que recomenda sejam os fatos examinados com
tanto maior circunspeção quanto mais extraordinários pareçam.”
Eis o artigo: “De todas as teorias lançadas para explicar
naturalmente os diversos fenômenos conhecidos sob o nome de
espiritualismo americano, não há uma só que alcance o objetivo, e,
menos ainda, consiga dar a razão de todos eles. Se uma ou outra
dessas hipóteses é suficiente para explicar alguns desses fenômenos,
sempre restará alguns que permanecerão inexplicáveis. A fraude, a
mentira, o exagero, as alucinações sem dúvida devem ter uma grande
parte nos fatos referidos; mas, feito o desconto, resta ainda um
volume tal que, para negar a realidade, seria preciso recusar toda fé
na autoridade dos sentidos e no testemunho humano.
Entre os fatos
em questão, um certo número pode ser explicado pela teoria
mecânica ou mecânico-fisiológica; porém, há uma parte, muito mais
considerável, que não se presta de maneira alguma a uma explicação
desse gênero.
A essa ordem de fatos se ligam todos os fenômenos
nos quais, dizem, os efeitos obtidos ultrapassam, evidentemente, a
intensidade da força motriz que os deveria produzir. Tais são:
1o - os
movimentos; os sobressaltos violentos de massas pesadas e
solidamente equilibradas, à simples pressão e ao leve toque das
mãos;
2o - os efeitos e os movimentos que se produzem sem nenhum
contato, conseqüentemente sem qualquer impulso mecânico, seja
imediato ou mediato; e, enfim, esses outros efeitos, que são de
natureza a manifestar, em quem os produz, uma inteligência e uma
vontade distintas das dos experimentadores.
Para dar a razão dessas
três ordens de fatos diversos, temos ainda a teoria do magnetismo; mas, por maiores que sejam as concessões que se lhe disponha a
fazer, e mesmo admitindo, de olhos fechados, todas as hipóteses
gratuitas sobre as quais ela se funda, todos os erros e absurdos de
que está repleta, e as faculdades miraculosas por ela atribuídas à
vontade humana, ao fluido nervoso ou a quaisquer outros agentes
magnéticos, jamais poderá essa teoria, com o auxílio desses
princípios, explicar completamente como uma mesa magnetizada
por um médium manifesta em seus movimentos uma inteligência e
uma vontade próprias, isto é, distintas das do médium e que, por
vezes, são contrárias e superiores à sua inteligência e vontade.
“Como dar a razão de semelhantes fenômenos?
Queremos, também nós, recorrer a não sei que causas ocultas, a que
forças ainda desconhecidas da Natureza?; a explicações novas de
certas faculdades, de certas leis que, até o presente, permaneceram
inertes e como que adormecidas no seio da Criação? Estaríamos,
desse modo, confessando abertamente a nossa ignorância e levando
o problema a aumentar o número de tantos enigmas, dos quais o
pobre espírito humano não pôde, até o momento, nem poderá jamais
decifrar. Aliás, não hesitamos em confessar nossa ignorância em relação
a vários dos fenômenos em questão, dos quais a natureza é tão
equívoca e tão obscura, que a atitude mais prudente, parece-nos, é
não tentar explicá-los. Em compensação, há outros para os quais não
nos é difícil encontrar a solução; é verdade que é impossível buscá-la
nas causas naturais; por que, então, hesitaríamos em recorrer às causas
que pertencem à ordem sobrenatural? Talvez fôssemos desviados pelas
objeções que nos opõem os cépticos e os que, negando essa ordem
sobrenatural, nos digam que não se pode definir até onde se estendem
as forças da Natureza; que o campo que ainda resta descobrir pelas
ciências físicas não tem limites e que ninguém conhece suficientemente
bem quais são os limites da ordem natural para poder indicar, com
precisão, o ponto onde termina esta e começa a outra.
A resposta a
tal objeção parece-nos fácil: admitindo que não se possa determinar,
de modo preciso, o ponto de divisão dessas duas ordens opostas, a
natural e a sobrenatural, não se segue daí que seja impossível definir com certeza se um dado efeito pertence a esta ou àquela. Quem pode,
no arco-íris, distinguir o ponto preciso onde acaba uma cor e começa
a seguinte? Quem pode fixar o instante exato onde termina o dia e
começa a noite? E, entretanto, não há um só homem, por mais limitado
que seja, que não distinga se tal zona do arco-íris é vermelha ou
amarela, se a tal hora é dia ou noite. Quem não percebe que, para
conhecer a natureza de um fato, de modo algum é necessário passar
pelo limite onde começa ou termina a categoria à qual o mesmo
pertence, e que basta constatar se tem os caracteres peculiares a essa
categoria?
“Apliquemos essa observação tão simples à presente
questão: não podemos dizer até onde vão as forças da Natureza;
entretanto, dando-se um fato podemos dizer, muitas vezes, com
certeza, segundo seus caracteres, que ele pertence à ordem
sobrenatural. E, para não sair do nosso problema, entre os fenômenos
das mesas falantes há vários que, em nossa opinião, manifestam
esses caracteres da maneira mais evidente; tais são aqueles nos quais
o agente que move as mesas age como causa inteligente e livre, ao
mesmo tempo em que revela uma inteligência e uma vontade
próprias, isto é, superiores ou contrárias à inteligência e à vontade
dos médiuns, dos experimentadores, dos assistentes; numa palavra,
distintas destas, qualquer que seja o modo que ateste essa distinção.
Seja como for, em casos tais somos forçados a admitir que esse
agente é um Espírito, e não é um Espírito humano, estando, desde
então, fora dessa ordem, dessas causas que costumamos chamar
naturais, daquelas que não ultrapassam as forças do homem.
“Tais são precisamente os fenômenos que, como
dissemos acima, resistiram a toda teoria baseada sobre princípios
puramente naturais, enquanto na nossa eles encontram mais fácil e
clara explicação, pois todos sabem que o poder dos Espíritos sobre a
matéria ultrapassa de muito o poder do homem, e porque não há
efeito maravilhoso, entre os citados da necromancia moderna, que
não possa ser atribuído à sua ação.
“Sabemos perfeitamente que, em nos vendo colocar em
cena os Espíritos, mais de um leitor sorrirá de piedade. Sem falar
dos que, verdadeiros materialistas, não acreditam na existência dos
Espíritos e rejeitam como fábula tudo quanto não seja matéria
ponderável e palpável, como também aqueles que, admitindo que
existem Espíritos, negam-lhes qualquer influência ou intervenção
no que diz respeito ao nosso mundo; há, em nossos dias, muitas
criaturas que, concedendo aos Espíritos o que nenhum bom católico
lhes poderia recusar, isto é, a existência e a faculdade de intervir
nos fatos da vida humana, de maneira oculta ou patente, ordinária
ou extraordinária, parecem todavia desmentir sua fé na prática, e
considerar como uma vergonha, como um excesso de credulidade,
como uma superstição de mulher velha, admitir a ação dos mesmos
Espíritos em certos casos especiais, contentando-se, em geral, em
não negá-la. Em verdade, há um século zombou-se tanto da
simplicidade da Idade Média, acusando-a de ver Espíritos, sortilégios
e feiticeiros por toda parte, e tanto se invectivou a esse respeito,
que não é de admirar que tantas cabeças fracas, querendo parecer
fortes, experimentem agora repugnância e uma espécie de vergonha
em crer na intervenção dos Espíritos. Mas esse excesso de
incredulidade não é menos despropositado do que em outras épocas
o foi o excesso contrário; se, em semelhante matéria, crer em demasia
leva a vãs superstições, por outro lado, nada querer admitir conduz
diretamente à impiedade do naturalismo.
O homem sábio, o cristão
prudente deve, pois, do mesmo modo, evitar esses dois extremos e
manter-se firme na linha intermediária: aí estão a verdade e a virtude.
Agora, nessa questão das mesas falantes, para que lado nos fará
inclinar uma fé prudente?
“A primeira, a mais sábia das regras que nos impõe
essa prudência ensina-nos que, para explicar os fenômenos que
oferecem um caráter extraordinário, somente se deve recorrer às
causas sobrenaturais se as pertencentes à ordem natural não forem
suficientes para os explicar. Em compensação, daí resulta a
obrigação de admitir as primeiras, quando as segundas são insuficientes; é justamente o nosso caso. Com efeito, entre os
fenômenos de que falamos, há aqueles para os quais nenhuma
teoria, nenhuma causa puramente natural poderia dar razão.
Assim,
pois, não só é prudente, mas necessário mesmo procurar sua
explicação na ordem sobrenatural ou, em outras palavras, atribuí-los a Espíritos puros, visto que, fora e acima da Natureza, outra
causa possível não existe.
“Eis uma segunda regra, um criterium infalível para se
afirmar, a respeito de um fato qualquer, se pertence à ordem natural
ou à sobrenatural: examinar-lhe bem os caracteres e, conforme eles,
determinar a natureza da causa que o produziu. Ora, os fatos mais
maravilhosos desse gênero, os que nenhuma outra teoria pode
explicar, apresentam caracteres tais que não só demonstram uma
causa inteligente e livre, mas ainda dotada de uma inteligência e de
uma vontade que nada têm de humano; portanto, não pode essa
causa deixar de ser senão um Espírito puro.
“Assim, por dois caminhos, um indireto e negativo,
que procede por exclusão, o outro direto e positivo, fundado sobre
a própria natureza dos fatos observados, chegaremos a essa mesma
conclusão, a saber: que entre os fenômenos da necromancia
moderna há pelo menos uma categoria de fatos que, sem nenhuma
dúvida, são produzidos pelos Espíritos. Somos levados a essa
conclusão por um raciocínio tão simples, tão natural que,
aceitando-o, longe do temor de ceder a uma imprudente
credulidade, julgamos, ao contrário, fazer prova de uma fraqueza
e de uma incoerência de espírito indesculpável, caso o recusemos.
Para confirmar a nossa asserção, não nos faltam argumentos, mas,
sim, espaço e tempo para desenvolvê-los aqui.
O que dissemos
até o momento é suficiente e pode resumir-se nas quatro seguintes
proposições:
“1º
Entre os fenômenos em questão, deixando de lado
os que podem razoavelmente ser atribuídos à impostura, às alucinações e aos exageros, grande número ainda existe, cuja
realidade não pode ser posta em dúvida sem que se violem todas as
leis de uma crítica sadia.
“2o
Todas as teorias naturais que expusemos e
discutimos acima são impotentes para dar uma explicação satisfatória
de todos esses fatos; se explicam algumas, deixam um grande número
– e estes são os mais difíceis – totalmente inexplicados e inexplicáveis.
“3o
Os fenômenos dessa última ordem, por implicarem
a ação de uma causa inteligente estranha ao homem, só podem ser
explicados pela intervenção dos Espíritos, seja qual for, aliás, o
caráter desses Espíritos, questão de que logo nos ocuparemos.
“4o Pode-se dividir todos esses fatos em quatro
categorias: muitos deles devem ser rejeitados como falsos ou como
produtos da fraude; quanto aos outros, os mais simples, os mais
fáceis de conceber, tais como as mesas girantes, em certas
circunstâncias admitem uma explicação puramente natural: a do
impulso mecânico, por exemplo; uma terceira classe compõe-se
de fenômenos mais extraordinários e mais misteriosos sobre a
natureza dos quais se fica em dúvida, porque, se bem que pareçam
ultrapassar as forças da Natureza, não apresentam, entretanto,
caracteres tais que, evidentemente, para os explicar, se deva
recorrer a uma causa sobrenatural.
Enfim, agrupamos na quarta
categoria os fatos que, oferecendo de maneira evidente esses
caracteres, devem ser atribuídos à operação invisível dos Espíritos
puros.
“Mas, que são esses Espíritos? Bons ou maus? Anjos
ou demônios? Almas bem-aventuradas ou almas condenadas? A
resposta a esta última parte de nosso problema não pode suscitar
dúvida, por pouco que se considere, de uma parte, a natureza desses
Espíritos e, de outra, o caráter de suas manifestações. É o que nos
falta demonstrar.”
Allan Kardec, janeiro de 1858
ESTUDO EM RESUMOS DOS CAPÍTULOS DE
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PARTE 2
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P2 CAPÍTULO 2: https://insightvocepordentro.blogspot.com/2019/09/cap-2-da-segunda-parte-o-livro-dos.html
P2 CAPÍTULO 3 : Você sabia que as primeiras psicografias surgiram das comunicações feitas com as mesas girantes do século 19? Veja como esse método foi aperfeiçoado até chegar nos moldes de hoje com as próprias mãos do médium! CLIQUE: https://insightvocepordentro.blogspot.com/2019/09/cap-3-da-segunda-parte-o-livro-dos.html
P2 CAPÍTULO 4: Respostas do estudo de Allan Kardec para:- O que é o O FLUIDO UNIVERSAL?- COMO O ESPÍRITO MOVIMENTA OBJETOS?- COMO FAZ O ESPÍRITO PARA CAUSAR RUÍDOS? SERVE-SE DE ALGUM OBJETO MATERIAL?- POR QUE UM ESPÍRITO SÓ PODE MOVER OBJETOS COM A PRESENÇA DE UM MÉDIUM ENCARNADO?-UM MÉDIUM PODE ATUAR COMO AUXILIAR DE UM ESPÍRITO SEM PERCEBER? Clique em: https://insightvocepordentro.blogspot.com/2019/10/c-p-i-t-u-l-o-4-da-segunda-parte-das.html
P2 CAPÍTULO 5: Fenômenos de Transporte. Clique: https://insightvocepordentro.blogspot.com/2019/10/c-p-i-t-u-l-o-5-da-segunda-parte-das.html
P2 CAPÍTULO 6: SOBRE AS APARIÇÕES. Este capítulo foi facilitado em quatro partes (A,B,C, D) abaixo :
v A. Leia também, o resumo A desse capítulo do Livro Dos Médiuns, em Noções sobre as Aparições, clicando no link:
v B. Leiam a continuação B do resumo deste capítulo em “ENSAIO TEÓRICO SOBRE AS APARIÇÕES”:
v C. Leiam a continuação C do resumo deste capítulo em “TEORIA DA ALUCINAÇÃO E ESPÍRITOS GLÓBULOS”, clicando no link:
https://insightvocepordentro.blogspot.com/2019/11/teoria-da-alucinacao-e.html
vD. Leiam a continuação D do resumo deste capítulo em "ESPÍRITOS GLÓBULOS":
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